[Resenha] Universo Zero

Universo Zero (2020) é uma antologia de Histórias em Quadrinhos de ficção-científica produzida pelo coletivo Quadro 9. A obra reúne oito contos que tratam sobre temores inerentes ao ser humano, como o medo da solidão e da morte; alertam ainda sobre os erros do presente e passado que podem levar a um futuro aterrador. Explorações a mundos estranhos, futuros desoladores e o perigo da extinção são examinados em Universo Zero. Esses temas são abordados através do roteiro e arte dos realizadores: Carlos Alberto, Cristal Moura, Leander Moura, Marcos Garcia, Mario Rasec, Rodrigo Xavier e Renato Medeiros.

Universo Zero reúne oito histórias de ficção científica produzidas por vários autores.

Em A semente (de Mário Rasec e Rodrigo Xavier), uma expedição à Marte descobre uma estrutura alienígena que abriga uma misteriosa forma de vida. Nesta, o script é sóbrio e com um tom de mistério, acompanhado de desenhos realistas que ajudam a estabelecer uma excelente atmosfera de suspense. A HQ tem uma simbologia mítica implícita que acrescenta uma camada a mais ao enredo.

O outro mundo (Renato Medeiros e Carlos Alberto) fala sobre um mundo pós-pandemia em que grande parte da vida no planeta foi exterminada e a sociedade precisou se abrigar em ambientes herméticos para evitar a contaminação. O texto é muito bem escrito, tem um viés poético e possui ilustrações que cumprem bem seu papel de complementar o texto.

Outra incursão em uma pandemia que se abateu sobre os seres humanos é vista em O abrigo, onde um grupo de sobreviventes envia emissários (Baltazar, Belchior e Gaspar) para fazer contato com outra comunidade remanescente. A caminho, os mensageiros são atacados por portadores do vírus. A trama tem como mote a reflexão acerca da natureza animal do ser humano e o fato de a espécie mascarar essa natureza por meio de um disfarce de ser racional e civilizado.        

Em O luto (Renato Medeiros), uma dupla de astronautas visita a Terra e vislumbra vestígios de uma civilização humana perdida (novamente dizimada por um vírus) e reflete sobre os erros que levaram a espécie à extinção. É uma história reflexiva e é mais bem contada pelo texto do que pela arte, e acaba ficando resumido muito mais ao que é dito do que ao que é mostrado.                                                  

E.L.A (Leander Moura)é focada no tema da autodescoberta, por meio de uma personagem que aparenta estar em busca de si mesma e sua identidade. A narrativa é bastante conceitual e a arte vai se transformando no decorrer das páginas, indo de realista à abstrata. As ideias são sugeridas e os significados ficam a critério da interpretação do leitor. Leander brilha ao apresentar uma arte primorosa e uma versatilidade estilística rara de se ver.

Stand up de robôs (Mario Rasec e Cristal Moura) segue um robô alienígena comediante em sua busca pela piada perfeita, que se depara com uma anedota elaborada por uma inteligência artificial terráquea. A ironia está no fato de que o gracejo que alçou uma máquina ao sucesso levou outra à desgraça.

Em Era de Aquário (Mário Rasec), um viajante solitário vaga por estradas e ruas desabitadas e tenta se conectar com o mundo através de seu contato com formas de arte como música e literatura. Os desenhos e a narrativa conseguem exprimir muito bem o clima de solidão, ao situar bem o personagem e relacioná-lo a paisagens abandonadas. A arte fotorrealista de Rasec ajuda a tornar esse ambiente despovoado ainda mais angustiante, especialmente quando cadáveres decompostos integram o deprimente cenário.

Solitude (Leander Moura e Marcos Garcia) em mais uma elegia a uma terra devastada, um solitário sobrevivente tentando se ocultar de ameaças à sua vida. A HQ traz um enredo simples que diz muito pouco, funciona quase como simples exercícios de narrativa. Traz um traço sem uma finalização caprichada, que peca, especialmente, no desenho mal-acabado do cenário de uma metrópole devastada.

Em Universo Zero, determinadas histórias tem uma narrativa sofisticada, arte refinada e roteiros mais sucintos, outras têm roteiros mais autoexplicativos, sendo que, a maioria tem finais abertos intrigantes. Como toda antologia que se preze, apesar de os argumentos terem um eixo em comum, a diferença de estilos de arte e roteiro enriquece a obra ao trazer contos com diferentes expressões acerca de temas correlacionados. Olhares distintos que, quando unidos, formam um conjunto que cumpre o papel de refletir e contestar que as prosas de ficção científica fazem melhor que as de qualquer outro gênero.

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